segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Por um Brasil de Viajantes

   

      Um dos grandes desafios do Brasil é criar uma sociedade de viajantes. Viajantes conhecem o mundo de forma inigualável, carregam uma vasta bagagem cultural, enxergam com olhos críticos, devoram o conhecimento. E não há melhor caminho para forma-los a não ser a leitura. Cada livro é uma viagem, um mundo novo que se conhece. Com mais conhecimento, é possível ampliar o vocabulário, desenvolver a escrita, a capacidade reflexiva. Formar viajantes, entretanto, não é tarefa fácil, principalmente em um país como o Brasil, em que uma série de empecilhos barram a disseminação do hábito de ler.
        O primeiro grande empecilho está em nossa formação. Encaramos a leitura como algo desinteressante, obrigatório e irrelevante, o que foi assimilado em casa e na escola. Na primeira, a problemática está na a falta de estímulos e de exemplos. Os pais precisam estreitar o contato entre a criança e os livros, mostrar que ler uma boa história pode ser tão divertido quanto assistir a um desenho animado e transpor essa atividade para o cotidiano de toda a família. Já na segunda, a problemática persiste na imposição aos alunos de obras cansativas, difíceis e incompatíveis com seu nível de maturidade, o que provoca uma certa repulsa a elas. Além disso, destaca-se nosso sugestivo método de ensino, no qual as aulas - em vez de explorarem a literatura, a pesquisa e o experimentalismo para contruir o conhecimento - centram-se na inserção de conteúdos "prontos". É como substituir o contemplar de uma boa viagem por imagens de cartões postais.
        Outro empecilho é a falta de investimentos por parte do governo. O descaso começa com a defasagem do sistema público de educação, o que se constitui em um contundente desestímulo à leitura no Brasil. As instituições de ensino carecem de livros, de uma estrutura física de qualidade, de profissionais comprometidos e de projetos eficazes na promoção do hábito de ler. E o cenário deplorável é refletido nas estatísticas: ocupamos a posição 53 - dentre 65 países - no ranking do Pisa e, segundo levantamento do Ibope Inteligência, lemos em média apenas 4 livros por ano. O decaso continua com a notória falta de infraestrutura suporte: as bibliotecas públicas. Elas são raridades em nosso país, ausentes em 362 municípios, o que explica o gritante fato de 75% da população brasileira nunca ter entrado em uma. É aí que reside uma grande contradição: somos a sexta maior economia mundial, temos pretensões de crescer cada vez mais e, ironicamente, não dispomos de quaisquer recursos expressivos em prol da educação, da leitura, que são as pontes para o exercício da cidadania e para o tão almejado desenvolvimento.
        De fato, são muitos os empecilhos, mas são igualmente muitas as soluções para a disseminação da leitura em nosso país, basta haver comprometimento. E o primeiro passo para isso deve ser em casa. Cabe aos pais reservar um lugar para que a criança descubra a leitura e, em meio a exemplos e incentivos, apaixone-se por ela. Os passeios da família podem incluir livrarias; e os presentes, os livros. Outro passo deve ser na escola. É necessário que as leituras não sejam obrigatórias ou incompatíveis com o nível de maturidade dos alunos: eles precisam ter contato com a obra certa e na fase certa, encarando-a como algo prazeroso e relevante. Com efeito, o comprometimento deve ser, primordialmente, por parte do governo. Um fundo monetário reservado para a leitura, projetos inventivos que a promovam, arrecadação ou compra de livros a serem disponibilizados nas escolas, capacitação de professores, construção de bibliotecas públicas. É disso que precisamos para desenvolver nosso país, para formar cidadãos que conhecem o mundo, que têm bagagem cultural, que enxergam com olhos críticos, que devoram o conhecimento. Precisamos de uma sociedade de leitores, precisamos de um Brasil de viajantes.
       


Um comentário:

  1. Academia Brasileira de Letras já! Texto envolvente, brilhante e digno de uma escritora. Aguardo anciosamente o lançamento do seu livro.

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